segunda-feira, 2 de maio de 2011

O que fazer quando mais uma vez me dou conta daquilo que já percebi faz tempo?
Intuição? Pressentimento?
Eu chamo de escuta. E a minha - aprimorada, modéstia a parte - às vezes me surpreende a ponto de eu preferir ficar surda. Mas escutar várias vezes me faz ter que agir, afinal.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Carta I

Querido,

tenho que começar dizendo que eu gosto de você. Mais do que deveria - e gostaria.  E foi por isso que, passados 8 meses resistindo, sucumbi ao seu jogo de sedução. Você não tem idéia de como essa escolha - a de ficar com você - foi difícil para mim. Eu que julguei que nunca seria a outra. Já tentei te dizer que fiz isso porque pensei prioritariamente em mim, em como me agradaria te tocar, sentir seu cheiro, experimentar seu beijo e ter você mexendo em meus cabelos. A emoção que senti no nosso primeiro beijo, aquele tremor incontrolável, a sua barba delicadamente arranhando meus lábios, eu entorpecida pelo seu cheiro - aquela emoção eu jamais vou esquecer.
Mas não vou ficar me justificando. Hoje tenho que te dizer que estou triste, frustada, decepcionada e preocupada. E pode até parecer que de tudo a tristeza é o pior desses afetos. Pois acredite: hoje não é. Para a tristeza me preparei desde o dia em que topei estar com você. Eu sabia que mais cedo ou mais tarde, por mais que eu não quisesse, eu teria que te deixar. Apenas em meus devaneios pensei que poderia ter você só para mim. Na realidade eu sabia que você nunca a deixaria para ficar comigo. Contudo, na minha fantasia, julguei que eu decidiria quando seria a vez de me entristecer. Julguei que eu decidiria a hora de te deixar. Mas você, por mais que não tenha querido me deixar, fez com que eu tivesse que antecipar a hora do fim. E foi dessa antecipação que veio a minha frustração. Confesso que eu gostaria de poder estar com você outras vezes. Mas você me enganou. Ficou noivo! Privou-me da única coisa que poderia me oferecer: a honestidade. Quando você se apresentava, dizia que tinha namorada. E me fez escolher entre ficar ou não com um cara que namora. Pensei em muita coisa para decidir. Fantasiei que talvez o seu namoro estivesse ruim, que seu encantamento por mim era legítimo, que quem sabe se a gente se der bem? Foi pensando nessas coisas, e no que eu queria - que era estar com você - que tomei a decisão. Mal sabia eu que escolhia um cara que não existe. Porque você não era um cara que tem namorada. Você era um cara que daí a uma semana viajaria para o exterior para pedir a namorada em noivado! Qual motivo você teve para não me dizer que minha escolha seria entre ficar ou não com um cara que vai noivar? Talvez pensasse que assim eu não ficaria com você. Pois tenho que te dizer que não tenho a resposta para isso. Não pensei na questão certa, mas na outra. E não é agora que vou pensar.
Hoje sei que marcando o seu compromisso com a outra, a oficial, esqueço mais uma vez de mim em nome dos meus valores. E não quero nem mesmo que você me apresente outra saída. Quero te esquecer. Porque estou decepcionada. E de tudo que tenho sentido, este é o pior afeto. Ficar sabendo da sua viagem na véspera foi horrível, e ali eu já senti uma dor, que talvez fosse até pressentimento. Mas minha paixão era grande. Julguei que você estava cuidando de mim. Melhor saber na véspera do que na volta, pensei. Quando, então, na volta da curta viagem, você ligou perguntando se as notícias sobre você e sua namorada eu queria saber de você ou dos outros, senti um segundo de euforia, pensando que talvez as notícias fossem boas para mim. Mas antes de eu pensar em rompimento você me falou no compromisso que honrou (dá para falar de honra aqui?) com outra mulher. Tristeza, frustração e decepção. De pronto! Imediatos! E minha tênue alegria se esvaindo pelo ralo. Eu quis chorar. Engasguei até o final do telefonema. Depois de desligar, a preocupação. Será que você fez tudo cronometrado mesmo, para me sacanear? Porque se você fazia investidas a meses, nós sabemos que elas foram mais fortes de algum tempo para cá. E por que você me escolheu para essa brincadeira? Então o interesse não era real? O que, de fato, te motivou? Dúvidas sofríveis para alguém que nunca sabe se - ou o quanto - pode despertar o desejo no outro. Resta te mandar à merda - do casamento!

terça-feira, 22 de março de 2011

Pré-ocupação

De repente sangra. E faz sangrar. Porque não sai do pensamento. E ocupa.
Cabeça vazia, oficina do diabo? Já não tenho certeza. Pode ser que o diabo faça oficinas mais produtivas nas cabeças mais ocupadas com pensamentos. Tem mais recurso. Mais material.
Cabeça pré-ocupada com causas, consequências e a eterna dúvida: onde foi que errei? Pré-ocupada também com o constrangimento que sempre é.Qual minha culpa? Você me perdoa?
De repente a certeza de que não tenho certeza sobre a vontade de não ser mãe. Melhor que o destino não decida por mim, afinal.

quarta-feira, 2 de março de 2011

Objetivo, atitude, resultados

Todos concordamos que a toda ação corresponde uma reação de igual intensidade, mesma força e sentido contrário. Mas quando essa ação se trata de uma atitude executada através das palavras, preocupa se ela não vai chegar a um objetivo diferente do planejado. Aliás, a chance disso acontecer é tão grande quanto o número de ditados populares que a confirmam. Neste minuto consigo pensar em pelo menos três: "o tiro saiu pela culatra", "a vaca foi pro brejo", "é o mesmo sol que derrete a cera e seca a argila".
Quantas vezes uma palavra não foi dita com um objetivo e acabou colocando tudo a perder? É que as palavras produzem ecos. Somente um deles vai acertar o objetivo. Outros vão nos fazer ficar cada vez mais longe dele. É a mesma palavra que te faz abrir os olhos e fechar o coração. Você tem noção de quanto mal faz aos outros por causa dessa maldita necessidade de falar? É que você não sabe, mas se prestar atenção perceberá que as tuas palavras são guiadas pelos seus propósitos menos conscientes. E que eu não perceba quais são eles, pois há o risco de que coloquemos tudo a perder.
Minha torcida é para que você, tanto quanto eu, esteja desejoso de que o sol seque a argila que o outro utiliza, vendo suas produções se solidificarem.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Que fantasia usar?

Sim, o carnaval chegou em Vitória. Aqui ele chega mais cedo que é por falta de público semana que vem. Nossas escolas não se comparam nem ao grupo de acesso das escolas do Rio, porém é fato que a cada ano os desfiles ficam mais badalados. As patricinhas e os playboyzinhos da cidade bombam o corpo disputando lugares de destaque. Mas é sabido que nessa terra de coronéis os destaques são os seus protegidos.

Ela, coitada, é uma sonhadora. Desejava desfilar numa dessas escolas. Naquela escola em que seu amado, é certo, vai de cigano. Mas não tem dinheiro para a fantasia. É porque por aqui há dois tipos de escola: as muito pobres, que não têm integrantes que não sejam das suas comunidades de origem (estas, aliás, as defendem com o sangue), sendo motivo de deboche de quem está de fora, e as que estão ficando ricas, nas quais os carros alegóricos já encantam, em que a comunidade desfila mas os coronéis e seus protegidos são destaque. Para desfilar ao lado dos ricos e, porque ele organizou a ala, ao lado do amado, há de se pagar caro. Ela não tem grana e já havia parado de sonhar, ao menos, que seria cigana ao lado dele.

Foi quando um amigo em comum lhe anunciou: a namorada do seu amado é protegida de coronel. Vai ser destaque na escola, tal como o é em tantos outros lugares. Sua fantasia de cigana está sobrando. E seu amigo lhe ofereceu tal fantasia.

Por alguns segundo o mundo parou de girar para ela. Ela usaria a fantasia da namorada de seu amado e desfilaria ao lado dele, enquanto a namorada estaria em outra ala. Seu coração agitou-se quando pensou que usar a fantasia da namorada seria tomar-lhe aquele lugar, e ficar com ele na mesma ala seria fazer parte de um mundo no qual só existiriam os dois... a namorada está fora, por escolha prória, deixando-os livres para se amarem. Ficou tão feliz e tão irracionalmente ingênua que aceitou a fantasia de cigana.

Contudo, a medida que o amigo foi explicando que a preparação para o desfile seria na casa da tal namorada, o mundo foi voltando, devagarzinho,  a girar. E ela foi se dando conta do que havia feito. Lembrou do corpo perfeito da namorada, tantas vezes exposto em campanhas publicitárias, e pensou no seu: era tão insegura quanto a ele! Imaginou a cena de todos se vestindo de ciganos e a namorada de destaque. Como ela poderia se destacar para convidar os olhos do amado a olharem para ela? Que fantasia usar para atrair-lhe a atenção?

E quando o mundo voltou a girar normalmente, ela se deu conta de que na verdade não há máscara que vista que a faça ter coragem de encarar de frente a namorada de seu amado. E não há fantasia que a faça se sentir confiante o suficiente a ponto de pensar que ele pode deixar a namorada para estar com ela.

Com medo de perder o que nem tem, angustiada pensando no que seria vê-los juntos antes e depois do desfile (será que durante o desfile ele ficaria ao lado dela? Ou disfarçaria que sabe do seu amor brincando com todos da mesma forma que brincaria com ela?) e entristecida, ela agradece ao amigo e desiste da fantasia.

E do sonho de ver a namorada fora da ala para que ela possa entrar, quando que vai se livrar?

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Pedrinhas de brilhante

Ele buscou o meu colo como se aquilo fosse habitual. Causou-me, contudo, bela surpresa e uma certa lisonja. Sem saber o que ele esperava, sua cabeça enconstada quieta sobre minhas pernas, enquanto as mãos balaçavam ritmadamente em frente ao seu rosto, comecei a acariciar-lhe os cabelos e a cantar. Cantei a canção infantil mais bonita que conheço: "Se essa rua, se essa rua fosse minha...", trocando a parte do "para o meu, para o meu amor..." por seu nome. Foi quando, então, vi um sorriso apacerer timidamente em seus lábios, sossegando suas mãos inquietas. Repeti a canção. Uma, duas, cinco vezes. Ele estava atento. De repente, enquanto cantava, vi seu rosto se virar em direção ao meu e sua mão vir em direção à minha face, oferecendo-me um toque desajeitado, que pretenciosamente chamei de carinho. Não parei de cantar, mas estava dividia entre a alegria de receber aquele olhar e aquele "carinho" e a angútia de pensar que se ele tivesse recebido esse colo que lhe dá lugar de sujeito na primeira infãncia, poderia suportar o mundo sem ter que recorrer ao autismo.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Da chegada

Aprendi no colegial que coisas abstratas são aquelas que não podemos pegar. Existe uma palavra para aquilo que escapa ao tato: subtil. Subtileza, por sua vez, é sinônimo de tenuidade, que também é sinônimo de fragilidade, delicadeza. E brincando assim com as palavras, escolhi o nome desse espaço virtual, que se dedica a falar do que escapa ao tato e delicadamente, torna-nos humanos: palavras, pensamentos e sentimentos. Quão frágil é a condição humana, pois que renunciando a qualquer um deles, corremos o risco de renunciar à nossa própria condição.